Uma das coisas mais difíceis para mim na infância era perder.
Meu pai trabalhou sério a fim de me ensinar a perder. Dizia que quem não sabia perder não estava pronto pra ganhar.
Também me proibia de fazer da alegria da vitória uma humilhação para os perdedores.
Uma vez me excedi na celebração de uma vitória bem na cara dos que haviam perdido o jogo, e papai não me deu parabéns pelo ganho, embora estivesse assistindo a partida e torcendo com muita alegria até ao final.
Ficou calado. Depois de um tempo me disse: “Não gostei do modo como vocês humilharam os que perderam. Para mim uma derrota teria sido melhor”.
As primeiras lições sobre perda na vida me vieram de meu pai. Ele perdeu. Perdeu tudo o que tinha conquistado. Foi humilhado e publicamente execrado, depois de cultuado como advogado e empresário, antes de sua conversão ao Evangelho.
O vi recomeçar do nada já na meia idade. O vi deixar tudo o que conquistará outra vez, só que agora de modo voluntário, pois, apenas queria dedicar o resto de sua existência à pregação e ao ensino do Evangelho.
Assisti sem entender as renuncias que ele fazia de coisas às quais tinha total direito, algumas vezes coisas que lhe renderiam uma fortuna; mas ele continuava firme no desejo de não ter dinheiro do passado na missão do presente.
Sofri com ele, mamãe e as manas a morte de meu mano Luiz, aos 19 anos de idade.
Depois fui testemunha das renuncias sem fim no dia a dia...
Ofendido, sempre dizia que a justiça do homem não promovia a justiça de Deus. Mas nunca fazia nada. Apenas entrega aos céus tudo e com todo amor.
Então, uma sucessão de perdas: a visão, a saúde, a capacidade de auto-locomoção, e de muitas outras coisas.
No entanto, apenas adaptou a vida às novas condições, mas não parou nada até o fim.
Estava tão habituado a perder sem sofrer como se fosse o fim das coisas, que, quando meu filho Lukas partiu, apenas disse a ele:
“Hoje estou sentindo a dor que o senhor e mamãe sentiram no dia 2 de novembro de 1976”.
Então ele me indagou: “Qual deles?”
Disse: “O Luk papai. O Luk!”
“Filho, agora é gloriamo-nos nas tribulações e na esperança da glória de Deus!”
Algumas lições de perdas os pais podem nos dar quando nos ensinam a perder e a ganhar — como em competições, etc.
Outras lições se pode aprender com o modo errado deles perderem ou pelo modo sadio como tenham aprendido a perder o que amavam.
Mas somente na vida, sob os caminhos misteriosos de Deus, é que se aprende a perder como quem ganha sempre.
Em tudo quanto um dia se me pareceu perda, confesso, diante de Deus e dos homens, que, logo depois, verifiquei terem sido os meus maiores e melhores ganhos na existência.
Entretanto, só foi assim pelo Evangelho e pelo ensino do Evangelho que vi praticado pelos meus pais.
O caminho humano nesta existência é um caminhar de perdas sempre...
Perde-se tudo, do vigor físico à memória; do poder de levantar e sair fazendo à falta de ilusão que justifique a necessidade de muitos e muitos feitos antes considerados essenciais.
Quando a mente está cativa do amor de Deus, todas as perdas são ganhos; e, ao final, o coração fica mais forte, mais amoroso, mais doce, mais esperançoso, e, infinitamente menos agoniado acerca de tudo.
Cada perda provada em Deus, já acontece como prelúdio de um bem maior.
A sabedoria é não desperdiçar os sacramentos de alegria e novidade de vida que Deus vai fazendo passar diante de nós..., mesmo que vivos estejamos sob uma montanha de escombros.
Assim, mais uma vez, anuncia-se um principio do Evangelho:
“Porventura não convinha que o Cristo padecesse e entrasse em Sua Glória?”
Ora, essas palavras de Jesus foram tão assimiladas por Pedro, que na sua 1ª Epistola o apostolo nos diz que este é também o caminho de todo discípulo.
Quem não aprende a considerar toda perda como lucro por amor a um amor maior, o de Deus — esse jamais saberá qual seja a verdadeira jornada do discípulo no Caminho da Vida.
Portanto, há algumas lições da Jornada que a gente só fica de fato apto a entender quando Deus mesmo julga que seja a Hora; pois, antes, não se teria como assimilar; e, depois de certo tempo..., não se terá mais como crescer sem que alguma poda nos seja feita pelo Amor do Pai, o Agricultor de meu ser.
Assim, ame a Deus; e não se sinta jamais perdendo nada. No máximo você está na “muda”, como um pássaro perdendo as penas, mas preparando-se para uma nova estação: mais madura e de vôos mais certos e leves.
Nele, que ensinou o Caminho que faz de toda vitória apenas gratidão e de toda perda apenas uma transição para o melhor e mais excelente,
Caio
22 de fevereiro de 2009
Lago Norte
Brasília
DF
Nenhum comentário:
Postar um comentário